Adormecida – Cem Anos Para Sempre” faz releitura perturbadora do mito da Bela Adormecida
Trazer uma nova visão dos contos de fada sempre foi um terreno criativo fértil para os quadrinhos. A artista plástica e escritora Paula Mastroberti chega para adicionar novas ideias neste campo já tão rico. Sua obra, Adormecida – Cem Anos Para Sempre foi revelado ao público depois de mais de vinte anos escondido na produção particular da autora. Escrito no final dos anos 1980, ela decidiu guardar o material, que foi publicado pela editora 8Inverso em 2012 e reeditado agora pela Hipotética.
A HQ remete aos álbuns das HQs europeias, tanto pelo formato do livro quanto pela narrativa, privilegiando os cenários, mostrados quase sempre painéis de página inteira. Tem nítida influência de Moebius e outros autores de ficção-científica e fantasia presentes na revista Heavy Metal/Metal Hurlant. Seu trabalho ainda remete aos luxuosos álbuns infantis de contos de fada, voltado para crianças e muito famosos nos anos 1980. É um trabalho que requer um tempo maior também para contemplação.
Sem pressa, Paula conta a história de um príncipe aventureiro que após se perder no deserto encontra um misterioso castelo em ruínas, onde decide passar a noite. Ele então se vê envolvido em uma história que envolve uma maldição muito antiga e uma bela princesa adormecida.
Essa releitura da Bela Adormecida brinca com a velha dicotomia do bem e do mal presente no conto, mas adiciona um tom mais perturbador, temperado com momentos de tensão e alguma sensualidade. Há um tom de perigo palpável e constante, que é entrecortado pelo tom poético das palavras amaldiçoadas da feiticeira.
Estudiosa da influência dos contos de fadas, Paula conseguiu imprimir a sua própria interpretação desse mito, com destaque para o desfecho.
A edição da Hipotética está bem caprichada, com papel couché que traz ainda mais contraste para as belíssimas pranchas pintadas à mão, além de trazer um novo prefácio e um texto da pesquisadora Maria Clara Carneiro, que contextualizam a HQ. Publicada 22 anos depois de ser feita, e reeditada agora, Adormecida revela ao público uma autora interessada em recuperar o tom sombrio e aprofundado dos contos de fadas, que ainda hoje fascinam e assustam.
Por: Paulo Floro
Fonte: Revista O Grito